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quarta-feira, 1 de julho de 2015

BRAZIL: "Eu pedi a São João que me arrumasse um matrimônio...Isso é lá com Santo Antônio!


Viva Santo Antônio! Vivaaaa!
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Sérgio Antunes de Freitas

À medida que eu me aproximava, a figura se tornava mais caricata. O indivíduo estava sentado na grama, debaixo de uma pequena árvore, com toda a indumentária de um franciscano: as sandálias, o cinto de corda e o corte do cabelo!
Chegando mais próximo ainda, três sabiás pousaram em seus ombros e cabeça. Mas seu semblante continuava triste.
Cheguei perto e perguntei: - Tudo bem, amigo?
Ele balançou a cabeça vagarosa e negativamente.
- Como você se chama, amigo?
Ele respondeu com um sotaque lisboeta: - Dizem que fui batizado com o nome de Fernando Martins ou Fernando de Bulhões, mas ninguém tem provas disso. No mundo afora, me chamam de Santo António de Lisboa, por lá eu ter nascido, ou Santo António de Pádua, por lá eu ter morrido. Aqui no Brasil, me chamam apenas de Santo Antônio – com sotaque brasileiro na última frase.
Pensei tratar-se de um alucinado, mas continuei a conversa: - E qual a razão de sua tristeza?
Então, ele contou seu martírio: - Quando cheguei ao Brasil, construíram igrejas em minha homenagem. Nas fazendas, havia igrejinhas só para mim. Ou oratórios, em lugares de destaque na casa principal. Minha imagem estava em escapulários, broches, santinhos de papel, carregados nas bolsas e carteiras, também nos quadros em paredes das casas humildes. Mas, depois, passaram a me colocar na cozinha, atrás do filtro. Ou dentro do armário; e eu fico igual macarrão, por anos com o cheiro horrível de alho e óleo.
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- Eu morri em 1231 – continuou a falar. Mas, em 1668, me recrutaram e me assentaram praça. Cheguei a tenente-coronel, nomeado já aqui no Brasil. Justo eu, que sempre preguei a paz, fui relacionado com a guerra. Pior é que os senhores escravagistas invocavam meu nome para recuperarem negros fugidos. Aqui, ó, que eu ajudava! Talvez por conta dessas patentes militares pós-morte, dizem alguns que eu sou Ogum, o deus da guerra, no Candomblé. Pára com isso! Eu sou um instrumento de paz. Também já disseram que eu sou o Exu, o deus da comunicação. Disso eu gostei, pois fui um grande orador, admirado até pelo padre Antonio Vieira.
Aproveitei para tentar melhorar sua auto-estima: - Viu? Muita gente admira você!
Mas ele desconversou: - Fui um dos intelectuais mais notáveis de Portugal, em minha época, lá por 1220. Dei aulas em universidades francesas e italianas. Fui o primeiro Doutor da Ordem Franciscana, mas as pessoas só se lembram de mim como santo casamenteiro. Completamente equivocados, pois nem eu mesmo resolvi meu problema. Todo mundo sabe que eu ia me casar com a filha de João, mas o traíra do Pedro fugiu com aquela falsa, na hora de ir pro altar.

E veja só o que passo por conta disso – falou revoltado. Dias desses, uma solteirona feinha, feinha, mas isso eu não condeno, inculta, mal arrumada, mal cuidada, veio em minha direção, sonhando em casar com um galã da novela. Imagina a fila? Percebi que ia passar o resto de sua vida emborcado em um copo d’água. Ajoelhei e, fervoroso, rezei: - Pai, hoje, sou eu quem precisa de um milagre!
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Eu já estava convencido de que se tratava, de fato, do santo! E ele prosseguiu com sua catarse.
- Eu fico indignado, quando alguém está com um problema de difícil solução e uma carola de quinta categoria aconselha: - “Dá uma surra no Santo Antônio”. É mole? Ou, então, tiram o Menino Jesus dos meus braços e eu fico procurando o moleque, até que o problema seja resolvido. Não são devotos, são chantagistas!
Transtornado, contou: - Estou procurando um bom advogado, que entre com um pedido na Igreja, para a minha desbeatificação e minha descanonização. Cansei! Tenho certeza que meu colega de Ordem, o Papa Francisco, não vai indeferir meu pedido.
Mas preciso de dinheiro para o pagamento das custas. Por isso, fui a uma igreja e pedi uns trocados. Não sabia que era um templo evangélico! O pastor me disse não acreditar em mim nem na minha imagem. Saí humilhado!
Nesse ponto, meu coração amoleceu e eu comecei a conversar com ele sobre a filosofia maravilhosa de São Francisco de Assis, com quem ele disse ter convivido.
De repente, vi um terceiro se aproximar, olhando para mim. E quando olhei de lado, o Santo havia sumido. E eu falando sozinho!
O cara se aproximou e me perguntou: - Tudo bem, amigo?
Pensei rapidamente e respondi: - Sim, não me estranhe, eu sou ator de teatro e costumo vir aqui repassar meus textos. Pode ouvir se quiser!
Abri os braços e comecei:
Onde está a linha da minha vida, Eurídice?
Os versos e os números na roleta...
Mas já não dizem mais o que um dia eu disse:
- É preciso saber tudo para que esqueça!

Sérgio Antunes de Freitas
27 de junho de 2015

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