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quinta-feira, 16 de julho de 2015

BRAZIL: "Você é meu brinquedo, sim!"

O Brinquedo
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www.google.com.br/images. Chaplin e Jackie Coogan no inesquecível "O garoto".


Sérgio Antunes de Freitas

(Crônica baseada em fato real)

A diretora do orfanato estendeu um papel, informando: - Senhor Ranulfo, este é o termo de responsabilidade. Leia e assine. Quero apenas lembrar que a criança deverá ser devolvida amanhã, até às 19 horas, sem falta.
Ele assinou sem ler e olhou para a porta que se abria.
A diretora se dirigiu a um menino de uns cinco anos, trazido até a sala por uma assistente, e disse: - Helinho, você vai passar o fim de semana com o Senhor Ranulfo. Você quer?
O garoto não se mexeu nem disse nada e ela repetiu: - Helinho, você vai passar o fim de semana com o Senhor Ranulfo. Tudo bem?
O garoto continuou de cabeça baixa, mas quando o homem levou a mão em sua direção, ele a agarrou com firmeza.
Saíram em silêncio, após as despedidas.
No carro, Ranulfo perguntou: - Você sabe cantar alguma música?
- Não.
-Então, eu vou ensinar uma pra você. É assim: - Sapo cururu, na beira do rio...
- Essa eu sei!
- Então, eu vou ensinar as que você não sabe. Vamos cantando até o parque. Ciranda, cirandinha, você sabe?
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Durante o fim de semana, o homem levou o garoto para brincar, para comprar roupas, brinquedos, lanches, e ainda teve o banho demorado, a cama quentinha, as músicas e os abraços.
No dia seguinte, às 19 horas, levou o menino, feliz com seu tênis colorido, suas roupas novas e os brinquedos, de volta ao orfanato.
E foram assim muitos outros fins de semana e feriados.
Bem maior, em uma das saídas, o garoto estava mais quieto do que de costume, entristecido. Querendo saber o que havia acontecido, o homem foi perguntado coisas, até que veio o questionamento, há muito esperado: - Por que você não me leva pra morar com você?
Ranulfo respondeu: - Eu tenho que trabalhar, viajo muito, não posso deixar você sozinho em casa durante a semana toda.
E o garoto perguntou com um pouco de revolta: - Eu não passo de um brinquedo pra você, né?
Rindo, Ranulfo respondeu: - Sabe aquele carrinho azul que você gosta? Agora, ele está lá, junto dos outros brinquedos, esperando por você para brincar. Mas você não pode ir agora, porque nós vamos ao cinema! Você é meu brinquedo, sim! E eu quero brincar com você sempre que puder, por toda a vida!
A rotina continuou, com idas a festas dos filhos de amigos do homem, a circos, a parques, a pistas de patinação, a livrarias, com revistinhas e álbuns, a eventos esportivos, a eventos culturais de música, teatro, dança.
Muitas vezes, Ranulfo recebia avisos da instituição, informando que o garoto estava doente. Quando não ia de imediato, pedia para um amigo levar remédios, dinheiro ou simplesmente dar um pouco de atenção e carinho.
Tudo entre suspeitas e maledicências de conhecidos!
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Passados mais de quarenta anos, um telefonema noturno confirmou a morte de Ranulfo.
Hélio foi ao velório e ficou em vigília a noite inteira, sem dizer uma única palavra, apenas com a cabeça baixa, em profunda tristeza, tocando no corpo algumas vezes.
Na manhã seguinte, pouco antes do sepultamento, ele se despediu do amigo com um afago na cabeça, pegou seu casaco e foi se retirando do local, quando um conhecido perguntou: - Professor Hélio, o Senhor não vai ficar para o enterro?
- Não! Não posso – justificou. Já estou muito atrasado para ir ao encontro do meu brinquedo.
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Sérgio Antunes de Freitas
15 de julho de 2015

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