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sexta-feira, 19 de agosto de 2022

BRAZIL. CÂNCER E "CAUSOS"

 F*CK CÂNCER

Foto do grupo Toque de Amor- 2012. Degrau de cima: Cristiane Bittencout(fundadora), Denise Paiva; trio a partir da direita: Kelly (fundadora), Ana Carolina Calabró e eu, dez anos curada.

Marina da Silva

Então...

Quase seis meses entre desconfianças, exames, consultas, mais exames para confirmar o diagnóstico: é cancer? chegou Agosto e com ele a cirurgia dupla: mama direita recebeu uma recauchutada com retirada de tecidos cicatriciais e calcificações que me encheram a paciência nestes 21 anos do primeiro perrengue; mama esquerda, mastectomia para retirada do tumor (novo carcinoma invasivo) e reconstrução com implante de silicone.

Meodeusducéu! Como conseguir passar tudo de novo e sozinha desta vez? Entrei no bonde PESADÃO da Iza: firme e forte na fé, fé para quem tem foco, fé para quem não foge a luta, fé para meter o pé no cú deste tumor filhadaputa! Obrigada Iza, sua poesia de fé me ajudou muito e eu sabia desde sempre que a "Fé não costuma falhar"! Criei uma estratégia defensiva para não adoecer mentalmente, deixar o medo se apossar da minha pessoa e azedar tudo como da primeira vez. Um trem muito louco: fingimento, fingir que nada está acontecendo comigo e que sou um avatar, uma criatura de um mundo mágico. E deu certo nestes seis meses!

https://youtu.be/Tr7mwAGTdK4


Aí   vem você com um balde de água fria, só pra me contrariar:

"Filha, está é apenas a fase negação, não-aceitação de um "luto"; todo mundo passa por isso em qualquer perrengue da vida."

E eu:

"Amiguix, você está corretix para a primeira vez, vinte anos atrás quando tive o primeiro evento. Negar me ajudou a lidar com está primeira fase em que eu me sentia ter levado um tapão na cabeça, daqueles "Tá ligado" que a polícia do meu estado abusa em aplicar nos trabalhadores pobres, renda-baixa, estudantes, principalmente de pele preta e morador de favelas, aglomerados, conjuntos habitacionais populares e principalmente para os moradores em situação de rua, principalmente nas cracolândias. Em 2002 eu "Quase morri...de medo!"

Neste evento novo resolvi, racionalmente, criar uma persona e um lugar mágico para lidar com o perrengue tendo como amiga minha samambaia Sammy - que quase matei botando borra de café na coitada - e a terapeuta Ana Elisa. Então quando desconfiei do trem na mama, avisei:

"Vou fazer tudo diferente desta vez! Nada de pânico, desespero, surto e ideias malucas. Não vou sobrecarregar ninguém, vou fazer tudo sozinha."

"Tudo bem se estiver funcionando para você, mas vamos acompanhando...". Bom acordo com a psicoterapeuta.

BARUERI. SP. Eu, num dos Encontros Nacionais do grupo de apoio às mulheres no perrengue câncer: Menina de Peito https://www.facebook.com/groups/amigas.peito


Aos 59 anos de idade, solteira, filha adulta, totalmente livre, leve, solta, dona do meu nariz, trabalhando e publicando em blogs e outras redes sociais (tenho muitas), vacinada com quatro doses de vacina anti-Covid-19, falei para o mastologista Dr. Gabriel:

"Não vou chorar, não vai ter livro desta vez! Passa os exames para cá, eu sou a mãe, eu estou no comando!" 

Foi mais ou menos isto. Só lembro que estava numa calma assustadora, para ele, que disse e me parabenizou pela maturidade. Minha filha participou de três consultas: na primeira para avisar que eu faria vários exames para saber se o trem era câncer; na segunda para confirmação do câncer e numa terceira com o cirurgião da reconstrução. Eu decidi assim, não aceitei ajuda de ninguém (estou mentindo, claaaaro!). Todas as vezes que falei que estava no perrengue, todos que me conhecem, exceto amigas e meninas de peito, sem qualquer exceção me falavam:

"Você é forte, você já passou por isto uma vez e venceu; você tira de letra; você é guerreira; você tem muita fé" e só me diziam coisas empoderadoras. Tomei posse. Apoderei de todas as afirmações e esta foi uma das partes do plano fingir, que na verdade é um sistema psicológico de defesa complexo e vem dos estudos de psicopatologia do trabalho e pesquisa do francês Christopher Dejours. Foi ele, quem estudando por anos o processo de trabalho X adoecimento criou a categoria "estratégia defensiva" nos anos Noventa, século XX.

GRUPO PÉROLAS DE MINAS: MEU PODER E MINHA FORÇA VEM DAÍ, DELAS.


"Eu sou forte, guerreira, comigo-ninguém-pode nem o câncer, sou poderosa, I" UNSTOPPABLE"! Não ter medo fingindo que não tem medo. Fingi tanto que acreditei piamente nisto tudo e todos acreditam também e é ruim de minha pessoa decepcionar alguém nesta altura do jogo. É uma estratégia complexa que envolve mais do que o fingir: dizer mantras de positividade para espantar ideias malucas (envolve rezas, orações, frases positivas); barrar cenários negativos mentais ou que me chegam dumeidunada criando imagens de abrigo que me tragam conforto e proteção - geralmente das minhas viagens; leitura de clássicos da literatura; livros científicos de geopolítica, geoeconomia; documentários; séries açucaradas e de ficção; filmes (nunca sobre doenças e câncer como Óleo de Lorenzo); nada de pesquisas doutor Google; palavrãoterapia; assistir jornalismo sério e independente (só pessoal consciente do xadrez político e geopolítico do país); estudar francês e inglês em filmes; costurar (aprendi na pandemia);  dançar e ouvir muita música nacional - sambas, pagodes, funk, rap, pop e todos ritmos engajados e de forte caráter social-cultural-histórico de resistência... Muita disciplina, exercício respiratório (a gente esquece de respirar e entra em pânico, tem crises de ansiedade). Adicionei butecos, restaurantes, estádios de futebol.

"Êh medo, eu não te escuto mais, você não me leva a nada"! Estabeleci esta meta, me impus esta meta: só vou chorar, espernear, dar piti, morrer de medo lá em 2060. Nada de ficar na cama, triste e encolhida; nada de choro nem como terapia. Só vou permitir choro, fraquezas, desespero, medo a partir de 2060 e peguei minhas tralhas, atravessei o guarda-roupas e me mudei para Nárnia entrando e saindo para trabalhar, fazer exercícios físicos, fazer exames, consultas, aulas de percussão circular, compras, supermercados, etc., e sessão de psicoterapia. O problema é que a terapia não é em Nárnia...

Um dia, em julho, após a mamotomia, dei uma baqueada e na sessão de terapia, desabei geral. Fui entrando no prédio como um autômato e como chegara uns minutos adiantada, fiquei na janela do décimo quinto andar olhando a cidade. De repente tive uma vertigem ao olhar para baixo e me vi "caindo" e senti o processo todo do medão querendo me pegar. Entrei para a sessão atordoada e fui direto para o divã (só vou ao divã quando estou perigando) e desmontei. Contei tudo, chorei horrores, desabafei). A sessão durou muito e claro, com aquela ideia maluca na cabeça. Só lembro que de repente pulei do divã, fui para uma cadeira que escolhi desde a primeira vez ( e claro que é a cadeira do terapeuta...Eu no comando sempre) e disse:

Aqui procê câncer! Pronto, falei.

"Agora chega! Já permiti esta Marina aí e não a quero". Saí da sessão renovada; precisava daquele momento, mas só um momento basta; a cirurgia estava próxima e na sessão seguinte falei que ia largar por enquanto a terapia. Lá era o lugar de "desmontar" agora, e eu precisava da minha armadura de aço adamantino, inquebrável de Nárnia.

P.s.: NÃO RECOMENDO NINGUÉM FAZER ESTA EXPERIÊNCIA QUE ESTOU FAZENDO.  É UMA "QUEIXADA DE BURRO", ISTO É, TEIMOSIA, BURRICE E NÁRNIA É SÓ IMAGINAÇÃO, FICÇÃO. PERMITA QUE AS PESSOAS SE APROXIMEM, AJUDEM. PEÇA AJUDA, SOCIALIZE O PERRENGUE COM QUEM ESTÁ PASSANDO O MESMO QUE VOCÊ E ENTENDE ESTAS LOUCURAS QUE A GENTE FAZ NESTAS SITUAÇÕES. NÃO COLOQUE DOR NUMA SITUAÇÃO QUE JÁ É DE MUITO SOFRIMENTO E DOR.

Nóis de Minas Gerais. Grupo Toque de Amor. NUNCA ESTIVE SÓ!


"Então por que você está se comportando assim?" Você pode me questionar a vontade. 

E eu:

"Uai? Eu lá vou saber! Teve a pandemia, a hérnia na barriga, caroço na testa, o GENOCIDA E O NEGACIONISMO, A CPI COVID-19, 680 MIL VIDAS PERDIDAS, NA MAIORIA PELA NECROPOLÍTICA DESTA CANALHA (que destruiu amizades, famílias e jogou ódio nos grupos de Apoio; muitas pessoas pararam de me seguir no Facebook, Twitter, blog; gente importantíssima nesta luta e que sucumbiu à maquina de ódio).Assim que voltar para a psicoterapia e conseguir ajuda para entender eu volto aqui e conto para você. É só o que posso prometer e confessar que esta minha atitude não é nada deste mundo. He, he, he." Abraço. Marina.

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