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terça-feira, 3 de maio de 2022

BRAZIL. FORÇAS ARMADA? CADA UMA NO SEU QUADRADO

 PRAZER, GENERAL!

Sérgio Antunes de Freitas

 

Lembrei-me de mais um episódio do primeiro semestre de 1972.

Minha vida se resumia ao campus universitário da Universidade de Brasília- UnB e o quarto em que eu morava, um pertinho do outro.

Por isso, quando um colega me convidou para ir ao apartamento de sua família, buscar algo que havia esquecido, em uma quadra rica de Brasília, eu fiquei quase eufórico de alegria.

E foi em um carro novinho, sonho de consumo na época. Opala, se não me engano.

Entrei na sala de seu apartamento e, no sofá, assistindo à televisão, um militar de meia idade, cheio de medalhas e insígnias.

Ele nos apresentou: - Pai, este é o meu colega, o Sérgio. Sérgio, este é o meu pai, General Fulano.

Que susto! A mais alta patente que eu conheci na vida, até aquele momento, era o Major Reinaldo, do Tiro de Guerra, vizinho da minha família.

- Prazer, General! – respondi educadamente.

Ele me escaneou de cima a baixo e ofereceu uma poltrona para conversarmos.

Não deve ter gostado de ver um moleque com botinas, dessas compradas em loja de produtos agropecuários, calça jeans, mas não “Lee”, a mais cara da época, e camiseta branca, da minha coleção de três iguais.

No rosto, barba por fazer, emoldurada por uma vasta cabeleira da moda!

Certamente, pensou: - Um comunista na minha sala, meu Deus!

Então, veio o interrogatório, até simpático! Que curso eu fazia, quem eram meus pais, de que cidade eu vinha, por que eu não cortava a barba e o cabelo?

Expliquei minhas condições de vítima da acne em meu rosto. Se fizesse a barba com gilete, poderia ter uma hemorragia.

E meu barbeador elétrico havia sido furtado, juntamente com meu radinho de pilhas, ou seja, fiquei sem nenhum patrimônio tecnológico, já nos primeiros minutos de um longo jogo da solidão. Mas aprendi na pele e com Drummond: “solidão é palavra de amor”.

Quanto ao cabelo, expliquei não ter dinheiro também para cortar, além de não existir nenhum barbeiro perto de onde eu morava. Só tosava nas férias!

Insatisfeito com minhas respostas, perguntou rudemente: - Você é comunista?

Assustado, respondi: - Para falar a verdade, General, eu nem sei o que é isso!

E não sabia mesmo, pois muitos livros eram proibidos. Só fui ler Karl Marx e outros, quando fiz uma matéria chamada Introdução à Economia. Li O Capital clandestinamente. E com medo, sem entender a razão da absurda proibição!

Ainda desconfiado, ameaçou: - Vocês, estudantes, devem tomar muito cuidado conosco, militares, pois nós somos treinados para matar.

Inocentemente, achando ser uma conversa igual às que eu tinha com colegas na Universidade, retruquei: - Então, está errado, pois os militares deveriam aprender a defender a vida das pessoas.

Ele se levantou, visivelmente transtornado, e foi marchando em direção à área íntima do apartamento. Deve ter recomendado ao filho retirar imediatamente aquele vermelhinho petulante da sala dele.

O rapaz me levou de volta à UnB e nunca mais conversou comigo. Filho obediente, disciplinado!

Em muitas outras ocasiões, ouvi militares, até muito amigos meus, confirmando com orgulho que, nos quartéis, se aprende a matar.

Na verdade, eles aprendem a guerrear, algo muito mais amplo.

Já li e escutei sobre seus cursos de espionagem, contraespionagem, torturas para obter informações, terrorismos, mentiras para enganar os inimigos, sigilos etc., muitos ministrados por instrutores estrangeiros. Por isso, precisam ter inimigos hipotéticos nos treinamentos, tais quais os comunistas, esquerdistas, russos, chineses, cubanos, argelinos. Depois, levam isso para suas famílias e círculos sociais. E os inimigos ficam sacramentados.

Enfim, a motivação de seus trabalhos é a suposta defesa, mas, também como costumam dizer, a melhor defesa é o ataque.

E são muito obstinados por isso. Quando assumem um cargo público, dizem se tratar de uma missão.

Suas atuações são sempre nos moldes bélicos, pois essa é a cultura das classes armadas. Adversário político vira inimigo. Leis civis podem ser desprezadas, em favor da perseguição da vitória a qualquer preço. E esses objetivos tornam-se essenciais, não importando o sofrimento ou a morte de inocentes, como acontece nos conflitos armados.

Após a aprendizagem, o confronto permanente passa a ser da natureza deles, em seus conceitos supostamente ideológicos.

Por isso, pessoas com formação estritamente militar não têm preparo para administrar a coisa civil. Quando assumem, acaba a paz na jurisdição. Já vimos isso muitas vezes em todo o mundo!

É importante eles cumprirem suas obrigações discriminadas na Constituição Federal e não irem além disso!

Pior, quando um indivíduo, com restrita formação militar, alto dirigente em cargo civil, ainda é um psicopata... Aí, é a desarmonia, o caos, o atraso, a tragédia, a treva!

 

Sérgio Antunes de Freitas

Abril de 2022

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