RIR É O MELHOR REMÉDIO
By Arthur Dantas
O olhar Marina da Silva sobre o Brasil e pelo mundo! AQUI É TOLERÂNCIA ZERO COM A INTOLERÂNCIA, AFINAL SOMOS TODOS HUMANOS!
RIR É O MELHOR REMÉDIO
By Arthur Dantas
TRUMPISMO:
UM BOLSONARO NA CASA BRANCA?!:;,...
Marina da Silva
Parte
1
Esta não é uma estória de ficção, infelizmente, e nem termina com a eleição do 46º presidente dos Estados Unidos da América Joe Biden (2021-2024) e desenrolará por um bom tempo e será estudada, cientificamente, por todas as ciências na busca de apreender, compreender e entender como, literalmente, um asno foi eleito presidente da potência Number One e se tornou do ponto de vista global do Ocidente, um dos maiores desastres geopolíticos e geoeconômicos de todos os tempos. Enquanto isto só se pode pinçar aqui e ali pedaços de eventos e fatos históricos e contar como os eleitores norte-americanos (mas não apenas eles) elegeram o asno como presidente dos Estados Unidos.1 Na História mundial, Calígula fez do seu cavalo um senador, no século XXI, muitos “imperadores bilionários capitalistas anarco-libertarianos”2 fizeram asnos...presidentes!
Foi assim...
Montar no asno Donald Trump (2016-2020), “demitido” por seus atos, performances, shows e condutas maléficas e toscas - que fizeram tremer a balança do poder mundial, ainda favorável aos EUA - e sua posição negacionista da pandemia Covid-198 e derrota nas eleições de 2020 e ir para Flórida com ele não responderá a questão:
“Como os EUA, a
superpotência capitalista, “os donos e polícia do mundo” desde o século XX, elegeram um
asno para presidente, considerado o maior erro geopolítico, geoestratégico e
geoeconômico de todos os séculos e séculos amém?”
De sonho americano, Donald
Trump9 se tornou o oposto. Um adulto
intelectualmente atrofiado, egocêntrico, mentecapto, idiota, espalhador de mentiras, lorotas, fake news; um mero
apostador fracassado nos próprios cassinos, atolado em dívidas, suspeito de
crimes financeiros e conluios com nativos (políticos e lobistas) e com velhos
inimigos dos norte-americanos [russos], enfim, virou o pesadelo americano eleito
democraticamente presidente em 2016.
Donald Trump nasceu rico na “construção civil” filho do bem sucedido empresário Fred Trump na “era de ouro” para os Estados Unidos conduzida pelo New Deal de Roosevelt a partir de 1933. Neste “novo acordo”, o Estado tomou para si a condução e regulação da economia, políticas públicas sociais, recuperação de bancos, investimento de capital no processo produtivo, em infraestruturas, na ciência e tecnologia, na regulação financeira e do mundo do trabalho após a grave crise dos anos Trinta gerada em Wall Street - quebra do sistema financeiro, conhecida como crash da Bolsa de Nova York em 1929.
Qual é o papel do Estado? Para que foi criado o Estado? Quanto de “Estado” os capitalistas podem suportar... nas graves crises?
Não vamos aqui entrar
nesta querela de tamanho de ESTADO, um embate e confronto de ideias que foi levado a cabo por F. Hayek
(1899-1992) e J. Maynard Keynes (1883-1946), um duelo econômico histórico que
influenciou e influencia gerações e virou livro: KEYNES x HAYEK11.
“As origens e a herança do maior duelo econômico da história.
Dois dos maiores economistas da história, John Maynard Keynes e Friedrich
August von Hayek estiveram em lados opostos na maior batalha econômica de todos
os tempos: se os governos deveriam ou não intervir nos mercados. Nas ruínas da
Primeira Guerra Mundial, ambos estudaram o crescimento e a queda do ciclo de
negócios, chegando a conclusões muito diferentes: Hayek achava que alterar o
"equilíbrio natural" da economia resultaria em inflação galopante,
enquanto Keynes acreditava que o desemprego em massa e a miséria que marcavam o
fim de um ciclo poderiam ser encurtados com gasto governamental. Suas ideias
ganhariam e perderiam o apoio de políticos – de Franklin Roosevelt a George W.
Bush –, além de influenciar a vida e o sustento de milhões. Da Grande Depressão
à Segunda Guerra Mundial, e da recuperação do pós-guerra aos dias atuais, o
veterano jornalista Nicholas Wapshott examina, neste Keynes x Hayek, os
animados debates entre esses dois gigantes do século XX cujas visões
divergentes moldaram a ascensão e a queda de economias em todo o mundo.” idem
Com o mundo destruído, LITERALMENTE, claro que sai vencedor o keynesianismo e todos os defensores do livre mercado econômico, radicais pelo capitalismo (liberais clássicos, republicanos e democratas neoliberais, libertarianos, anarco-libertarianos) recolhem as asas e garras, recuam e, trabalhando muito nos Estados Unidos nas décadas seguintes: Literatura, jornalismo, seminários, planfletagem, montando quartéis laissez-faire em institutos, fundações, escolas e grupos de ativismo nas faculdades e universidades nos cursos de economia, administração, sociologia, psicologia e outros, criando um Fórum Internacional de discussões na Suiça, conhecido como Sociedade Mont-Pélerin (retorno ao liberalismo) e algumas "igrejas".12
O guia para retorno do
livre mercado foi escrito por F. Hayek: O CAMINHO DA SERVIDÃO13, muito parecido com o guia político O Príncipe de
Nicolau Maquiavel, a meu
ver, adepta da origem do homem como "ser social" que constrói historicamente e progressivamente a complexa sociabilidade humana juntamente com os outros seres humanos, cães e gatos exclusos.14 Claro que não posso afirmar isto de um economista e filósofo da economia, ganhador do prêmio Nobel15 (defensor da ação humana individual, egoísta livre, radicalmente contrário às ideias e filosofias coletivistas, socialistas, comunistas, e de Jesus, o Cristo) e que viveu o horror de quase meio século de guerras, fome peste no "século curto" sob o império das disputas imperialistas pelos mercados mundiais, matérias-primas e mão-de-obra e morrendo de medo do bicho-papão, quer dizer, das ideias coletivistas, do dirigismo estatal autoritário, da planificação e regulação da economia pelos defensores do comunismo, socialismo, social democracia , sistemas e formas de governo, que segundo Hayek descambam INEXORAVELMENTE no totalitarismo, no intervencionismo estatal na economia (mesmo que as experiências do welfare State o contradigam). O medo é real assim como o contexto histórico de maior poder do Estado sobre tudo e todos. Não, Hayek não "copiou/colou" Maquiavel e é ele mesmo quem esclarece qualquer dúvida:
"Este é um livro político" e não um "ensaio de filosofia social" "e as "convicções que nele se expressam não são ditadas por meus interesses pessoais" e sim de valores capitais fundamentais que ele crê, aderiu e defende: a retomada do liberalismo econômico, estado-mínimo, livre mercado econômico, individualismo, egoísmo, lucro. Toda a preocupação e apreensão de Hayek está nas tendências socialistas, comunistas do momento (revolução Russa em 1917, ascensão do totalitarismo na Europa nos Anos 30, fortalecimento das ideias nacional-socialistas, social-democracia... A tese do livro apareceu pela primeira vez "num artigo intitulado A Liberdade e o Sistema Econômico, publicado em 1938. (HAYECK: P.9-10)
Depois que você toma conhecimento da obra The Conscience of the a Conservative de Barry Goldwater16, passa a concordar com Hayek. Realmente, esta obra é o guia de ação política por excelência para conservadores e/ou anarco-libertarianos como Roger Stone. Ver documentário citado na bibliografia. Para os radicais pelo capitalismo, o papel e tamanho do Estado está amalgamado aos princípios: laissez-faire, individualismo, egoísmo, ação [humana econômica] livre, não coletivista, não intervencionista; contra planejamento central e dirigismo estatal da economia. Existe na "conscience" permissão apenas para um Estado liberal de Direito, com normas formais estritas para situações gerais, e momentos de guerras, situações graves e/ou de crise do capital. Somente neste Estado mínimo [minarquia plutocrática], o Estado Liberal de Direito pode existir e no contexto de incertezas, irracionalidade e imprevisibilidade do capitalismo (Hayek, cap.6), ou seja, quando os capitalistas fazem merda chamam o socorro do Estado. Para Murray Rothbart nem este tipo de "estado" é passível de existência, Estado nenhum é o melhor estado.
***
Pausa para informação importante:
"Tudo o que o Estado faz, uma empresa privada faz e melhor e aqui vou citar a repetiola desta frase pelos economistas de plantão da rede Globo desde 1990, data de início das práticas neoliberais no Brasil, levadas à cabo no governo de FHC- Fernando Henrique Cardoso, Partido da Social Democracia brasileira, na verdade, um "agente de Estado utilitário" empregado pelos Estados Unidos (1994-2001). Todo o foco deste governo foi voltado para privatizações de estatais que davam muito lucro a preço de banana. O caso mais escandaloso se refere a Cia. Vale do Rio Doce. Sobre o tema ler A Privataria Tucana. Pesquise o autor.
***
Voltando ao tema...
Donald Trump é “educado”
na filosofia política da escola austríaca de economia e principalmente "no fundamentalismo oportunista, mau-caráter, corrompido, descarado, hipócrita de Rothbart e sua
gangue pró-macartismo (perseguição e caça aos comunistas, leia-se perseguição à Intelligentsia* americana), culto ao capitalismo
anárquico e libertário: anarco-libertarianismo de Direita; liberdade extrema, individualismo e egoísmo extremos, desprezo e destruição do Estado. Trump já tinha na bagagem o conservadorismo republicano liberal tradição-família-propriedade, temperado pelo racismo, homofobia, latino-fobia, (principalmente contra mexicanos), misoginia, machismo e outros vícios explícitos e tratados com extremado zelo e um fascínio pelo culto narcisista e parasita do brilho e holofotes da mídia, fazendo qualquer coisa para aparecer e lançar suas mentiras e colher ótimos frutos e fãs.17
Parte 2
POR QUE DONALD TRUMP NÃO SE TORNOU PRESIDENTE DOS ESTADOS UNIDOS NOS ANOS OITENTA, NOVENTA OU NO PRIMEIRO QUARTEL DO SÉCULO XXI?
*https://pt.wikipedia.org/wiki/Intelligentsia "O termo intelligentsia (do russo:[1][2] интеллигенция, do latim: intelligentia) usualmente refere-se a uma categoria ou grupo de pessoas envolvidas em trabalho intelectual complexo e criativo direcionado ao desenvolvimento e disseminação da cultura, abrangendo trabalhadores intelectuais."
1. O PAPEL DAS REDES
SOCIAIS E SEU USO PARA “ALTERAR RESULTADO DE ELEIÇÕES” Ver THE GREAT HACK;
SOCIAL DILEMMA https://www.netflix.com/watch/81254224?trackId=14170286&tctx=1%2C4%2Cde028b6f-bc2d-4239-bccd-a40a4ad91e08-36686501%2C588b6ed5-31dd-4eca-9901-51edd89c8100_58426297X3XX1611323976977%2C588b6ed5-31dd-4eca-9901-51edd89c8100_ROOT%2C.
2. Para entender as
“nuances” conceituais sobre o que é" liberal, liberalismo" dos radicais defensores
capitalistas do mercado econômico livre ler: Capitalismo para todos ou
capitalismo para alguns de Robert Reich; Radicais pelo capitalismo de Brian Dhoreth. Ver em O caminho da servidão de F. Hayeck: "O uso a todo momento da palavra "liberal" em seu sentido originário, do século XIX,(...)Na linguagem corrente nos Estados Unidos, seu significado com frequência quase o oposto, pois, para camuflar-se movimentos esquerdistas deste país, auxiliados pela confusão mental de muitos que realmente acreditam na liberdade, fizeram com que "libera"l passasse a indicar a defesa de quase todo tipo de controle governamental."(Prefácio à edição americana, 1974:p.17. Ebook)
3. HARVEY, David. A CONDIÇÃO PÓS-MODERNA. São Paulo: editora Loyola, 1992.
4. MARX, K. A ORIGEM DO
CAPITAL. A Acumulação Primitiva. Coleção Bases 3. São Paulo, SP: Global Editora
e distribuidora Ltda.1979
5. Sobre a facilidade de conhecimento na
internet ver exemplos: REVOLUÇÃO INDUSTRIAL SEC.XIX. Guerras https://brasilescola.uol.com.br/guerras/guerra-francoprussiana.htm;IMPERIALISMO ;
https://www.youtube.com/watch?v=pUgbjFdxHU4&ab_channel=Aulaovivo;
UNIFICAÇÃO ALEMÃ E ITALIANA https://www.youtube.com/watch?v=96X6anUlEu8&ab_channel=Hist%C3%B3riaOnline;
A FAMÍLIA: Jesus salva (Uso geopolítico de Cristo contra avanço mulçumano) https://www.netflix.com/watch/80063867?trackId=14170286&tctx=1%2C5%2Cde028b6f-bc2d-4239-bccd-a40a4ad91e08-36686501%2C588b6ed5-31dd-4eca-9901-51edd89c8100_58426297X3XX1611323976977%2C588b6ed5-31dd-4eca-9901-51edd89c8100_ROOT%2C
6. Sobre a Golden age, momento áureo de crescimento e expansão econômica e social (1945-1973) ver: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31572005000100003; https://pt.wikipedia.org/wiki/Expans%C3%A3o_econ%C3%B4mica_do_p%C3%B3s-Segunda_Guerra_Mundial
7. CHOMSKI, Noan. O fim do
sonho americano. Documentário disponível no Youtube; REICH, R. SAVING CAPITALISM, documentário https://www.netflix.com/watch/80127558?trackId=13752289&tctx=0%2C0%2C793fa35ed111b0e1ba3ec3f809ecc8679a8c2448%3Adcc88be15af940737909e49bce35a8c9bc88a33a%2C793fa35ed111b0e1ba3ec3f809ecc8679a8c2448%3Adcc88be15af940737909e49bce35a8c9bc88a33a%2Cunknown%2C
8. Sobre a pandemia
COVID-19 ainda em curso ver: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pandemia_de_COVID-19 http://www.coc.fiocruz.br/index.php/pt/todas-as-noticias/1853-especial-covid-19-os-historiadores-e-a-pandemia.html#.YC_cUhpKiUk; https://www.bbc.com/portuguese/geral-51842518;https://www.unasus.gov.br/noticia/organizacao-mundial-de-saude-declara-pandemia-de-coronavirus.
9. Sobre o tema ver:
Donald Trum - Un American Dream. Documentário Netflix de como Trump foi
“construído” por fanáticos e fãs e usado como candidato republicano para
derrubar os democratas do poder (2008-2016) usando o poder de manipulação psicológica através de ódio, raiva, rancor e mentiras potencializados pela internet e uso das redes sociais e uso de dados privados de americanos, em estados-chaves pela empresa SCL GROUP- CAMBRIDGE ANALYTICA; GET ME ROGER STONE documentário https://www.netflix.com/watch/80114666?trackId=13752289&tctx=0%2C0%2Cef55f0626256b0b2a390709fb5ccd5c302a3bbd0%3Ab71cd1fa9c79fe9d1d0d43783f6a07347486a8b4%2Cef55f0626256b0b2a390709fb5ccd5c302a3bbd0%3Ab71cd1fa9c79fe9d1d0d43783f6a07347486a8b4%2Cunknown%2C
10.Sobre a criação da rede
mundial que conecta o mundo instantaneamente assistir: LO AND BEHOLD
documentário https://youtu.be/SSbhsPNnVWo
11. WAPSHOTT N. Keynes x Hayek: A origem e a herança do maior
duelo econômico da história. São Paulo, SP: Editora Record, 2016 em https://books.google.com.br/books/about/Keynes_x_Hayek.html?id=UVmwDAAAQBAJ&source=kp_book_description&redir_esc=y
12 .DHORETH, Brian. Radicals for Captalism: A freewilling History the Modern american Libertarian Movement. E-book. Sobre a acusação contra o CULTO Ayn Rand ver capítulo 5. OBJETIVISMO, ANARCHO-CAPITALISM, AND THE EFFECTS OF PSICHEDELICS ON FAITH AND FREEDOM, P. 225-291
13. HAYECK, F. O CAMINHO DA SERVIDÃO(1944). E-book.
16. GOLDWATER, Barry M.THE CONSCIENCE OF THE A CONSERVATIVE. EUA: published by Stellar Classics. 2013. E.Book.
17. Sobre Donald Trump e seus passos ver: documentários Trump, an american dream; A Décima Terceira Emenda; Get me Roger Stone;
The Family.PESQUISE.
BOLA
DE CRISTAL
Marina da Silva
A noite ainda ia alta
quando o relógio despertou aos pés da cama de Santuza, roubando-lhe as poucas
horas de prazer de um sono pesado. Deitara tarde na noite anterior. Tinha
comida por fazer, muita roupa pra passar
e por fim foi apenas sacudindo, dobrando e enchendo a cômoda que de tão
velha e cheia, estufara nos lados, mal encaixando as quatro gavetas. Embora
jovem, ainda não completara trinta e cinco anos, Santuza sentia-se e via-se
como uma velha. Pulou da cama que dividia com uma das duas filhas, entrou no
banheiro pra esvaziar a bexiga e saiu de lá pronta, num jeans e camiseta
surrados, cabelos puxados para trás e preso num desgrenhado rabo de cavalo.
Quando jovem, fora muito
vaidosa, tinha cabelos anelados, pele morena, lábios grossos e um traseiro que
era o seu maior patrimônio. Deixara a casa dos pais aos quase dezoito anos para
se casar com Antônio e vir morar na cidade grande. Profissão não tinha; estudos
muito pouco, não fora além da sexta série ginasial e o marido, um lindo rapagão
metalúrgico, não levou muito para encher-se da vida de casado e dos filhos e
cair de vez na gandaia.
Moravam em Veneza. Não a
bela e majestosa Veneza italiana, com seus canais, gôndolas e seu casario
fascinante; palco de luas-de-mel e encontros de amantes nos muitos filmes que assistira
com a mãe quando ainda morava no interior. Sua Veneza era na periferia da
capital, próximo ao CEASA e banhado por um esgoto a céu aberto que sempre
transbordava e levava alguns barracos a cada inundação de verão. Viera parar ali
pelos idos de 1982 e de lá para cá, a convivência com enchentes virara rotina.
Enquanto fazia um café
ralo e terminava o arroz, os pensamentos iam longe. As filhas, agora mocinhas,
não davam tanto trabalho quanto, ainda pequenas, era obrigada a deixá-las
muitas vezes sozinhas no barraco, sob o olhar de alguma vizinha enquanto
ganhava a vida como diarista. A preocupação de agora era outra. Raquel e
Soraia, suas filhas, estavam ainda na adolescência. A mais velha dezesseis anos
e Soraia ia completar quatorze na semana seguinte. Como a mãe, não tinham
cabeça para muito estudo e vivam fascinadas pelas novelas e programas de
auditório da televisão. Sabiam tudo sobre a vida dos artistas: quem estava ou
largou quem, quem deu vexame em festas, quem bebia, fumava, se drogava ou era a
capa da revista. Tinham, pregados na parede do minúsculo quarto, dois pôsteres
gigantes dos ídolos do momento. Sabiam todos os passos de dança das músicas “da
hora” e passavam horas cantando e ensaiando no barraco de três
cômodos a coreografia para os bailes funk nos sábados.
Santuza terminou seus
afazeres, montou sua marmita, deu uma olhada no quarto onde dormiam as filhas,
benzeu-se, apagou a vela e foi num passo acelerado para o ponto final do
ônibus, a única forma de fazer o longo trajeto sentada até o centro da capital.
Com sorte, a viagem não passava de cinquenta a sessenta minutos, tempo em que
ela vinha dormindo, boca aberta, cabeça pendida na janela, bolsa atracada nos
dois braços pra evitar ladrões.
Desde os anos noventa,
vivia mais sossegada. Sem marido, fora a luta, inicialmente como faxineira e
com a ajuda de uma das patroas conseguira emprego numa prestadora de serviço e
virou empregada de carteira assinada, jornada quarenta e quatro horas semanais.
Trabalho duro no palácio de justiça, salário se não muito pelo menos dava para
ir vivendo, pagar contas e até comprar usados, rádio, geladeira, duas camas e
televisão. Seu sonho agora era puxar mais um cômodo para os fundos e ter uma
sala de TV e um sofá. Entrava sem dar bom dia e
subia rápido pelas escadas até o sexto andar, para não dar trela ao porteiro
abusado e ser alvo de mexericos e fofocas. Conversava pouco, trabalhava muito.
Era incumbida de limpar dois andares repletos de salas, banheiros e copas onde
um batalhão de gente trabalhava.
Pegava serviço às seis
horas e só parava ao meio dia para o almoço com o estômago colado às costas. Ás
vezes um funcionário ou outro lhe cedia um pedaço de pão, biscoitos e até café
e algumas frutas.
Neste dia enquanto
esfregava as paredes, limpava portas e divisórias, a cabeça de Santuza estava
inquieta. As filhas de uma hora para outra largaram o ginásio, encorparam
rápido e andavam com umas companhias que nem precisava de bola de cristal para
ver onde tudo ia descambar. Suspeitava que Raquel fizera um aborto clandestino
no final de semana em que avisou que ia passar uns dias no sítio de uns amigos.
A irmã também estava
mudada, antes tímida e comportada, passou a andar com uma turma da “pesada”, o
grupo do Zé Pretinho, rapaz violento, conhecido pela sua ligação com o tráfico
de drogas. Santuza mal percebera o momento em que as filhas deixaram de ser
crianças para se tornarem mulheres, mas o que mais lhe preocupa e muito, era o
deslumbramento das duas com as novas amizades. Agora, sempre tinha coisa nova
em casa, presentes que ela não sabia de onde vinham, mas seu coração de mãe
suspeitava. Começou com pequenos mimos. Uns brincos, pulseiras, relógios que
vieram seguidos por jeans de marca, tênis importados caríssimos.
Sentia um aperto no peito,
pedia explicações que não satisfaziam o apelo de mãe. Via suas filhas se
perderem a cada dia e não via jeito de interromper o processo. Não tinha as
boas armas para o combate, que para ela seriam um homem de pulso em casa, a
religião, os cuidados de mãe que não podia dar por estar horas seguidas fora de
casa dando duro para sustentar a família.
Santuza saia do trabalho
às cinco horas da tarde e chegava lá pelas seis e meia, sete horas, dependo
muito da hora que o ônibus passava e as condições do trânsito. A volta era
sempre tortuosa e humilhante. Do trabalho ao ponto do ônibus na praça da
estação, Santuza andava uns bons vinte minutos, entre ruas repletas de gente,
carros e ambulantes. A fila para entrar no ônibus dava volta no quarteirão e
além de aguardar em pé tinha que se sujeitar aos “apertos e encontrões” na hora
de entrar no ônibus, passar pela roleta e em todo o trajeto na ida e vinda para
o trabalho. A volta era sempre em pé, dependurada tal qual aqueles salames em
vendinhas do interior. Se viesse em pé a passada de mão era certa!
Hoje estava cm o coração
apertado, pressentia algo ruim, não sabia o que. Tinha pedido a ajuda da mãe
com a mais nova e esta a havia carregado para o interior por uns bons três meses.
No entanto soubera pelos vizinhos que o tal Zé Pretinho não gostara e prometera
uma lição para ninguém jamais esquecer. Havia uma semana que Soraia voltara e o
tal ainda não dera as caras.
Santuza não conseguia
tranqüilizar seu coração, mas esperava que o tal limitasse a brigar com a
filha, tomar-lhe os presente e até bater-lhe. No entanto hoje, sentiu uma
aflição ao ver a menina dormindo, uma dor no peito que não soube explicar e que
se manteve durante todo o dia de trabalho. Estava ansiosa para chegar em casa,
ver as meninas, arrumar as coisas e preparar o jantar. E depois descansar para
mais um dia.
Já na rua de casa um
burburinho de gente e o barulho da sirene da polícia colocou todos os seus
sentidos em alerta. Começou a andar apressada e a rezar freneticamente, pedindo
a Deus que não fosse em sua casa. Não com as suas meninas. Quando viu a comadre
Colodina vindo aflita em sua direção, estacou lívida, não ouvia mais nada, não
sentia mais nada a não ser aquela terrível opressão no peito e na cabeça. As
pernas bambearam, a cabeça ficou rodando, sentia fortes zumbidos nos ouvidos,
pensou estar flutuando.
Zé Pretinho cumpria o prometido. Entrou na
casa com seu bando, arrastou a menina para fora, encharcou-lhe as roupas, todo
o corpo de gasolina, álcool, querosene e ateou fogo nela!
Ninguém se atreveu a
socorrê-la. O bando gargalhava, gritava, urrava, enquanto a pobre menina se
desfazia nas chamas, num ritual hediondo, satânico, macabro. A polícia chegou
tarde. Não havia mais socorro! Soraia estava morta, totalmente desfigurada!
Um pacto de silêncio,
terror, medo, encobriu os autores daquela crueldade. Lá embaixo, ao pé do
morro, Santuza quedou-se de joelhos com um olhar estranho, de alguém que já não
mais fazia parte da realidade.
LE DILEMME SOCIAL: IL Y A UN PROBLÈME.!? ...;