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quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

CORES E AINDA POR CIMA... UMA BRASTEMP!

TODA SOFISTICAÇÃO DO BRANCO...


Marina da Silva

Era a chamada na mídia, principalmente TV’s e revistas para o poder do branco: sofisticação, luxo, bom gosto do banheiro à cozinha, ali ainda nos anos oitenta, século XX. Estava decretado, pelo menos para os eletrodomésticos, o fim das outras cores, que tentaram resistir, sem muito sucesso, com o caramelo e o café com leite.
A fascinação aliada à imposição repetitiva de propagandas criou o império do branco. Do ferro de passar à máquina de lavar e tanquinhos espalhando-se pelo chão, subindo ao teto, passando pelas paredes e armários da cozinha. Deu um branco geral! Além de sofisticado o branco que é por assim dizer “ausência de cor” era chique, puro, calmo e iluminava...
Os dedos engordurados pelos armários e geladeiras, respingos de gordura e molhos empestando fogão, azulejos e exaustores, colorindo do piso ao teto e dando uma enorme visibilidade a sujeira! A faxina virou suplício! Com o branco veio a escravidão, principalmente para os obsessivos e neuróticos por limpeza. A cozinha virou sala de estar e explodiram programas de comidas nas TVs.
A febre do branco me tomou de assalto em 2000 numa virada 360° branca, total e radiante no novo apartamento e durou muito pouco, pois já em 2004 me veio  insubordinação e rebeldia com o estilo enfermaria de filme de quinta categoria.
Declarei guerra ao branco em 2005 e em 2006 na impossibilidade de alterar o estilo hospital pela compra de novos aparelhos _ além do branco, a única cor em voga é o cinza-grafite-necrotério que me lembra fornos de cremação Auschwitz em aço inoxidável _ resolvi por outros meios dar fim ao branco da geladeira e fogão!
Queria cor nova, viva e então nada melhor do que dar um trato nos eletrodomésticos tal qual a febre americana de transformar em supermáquinas, carros latas velhas.
Chamei um profissional, escolhi a cor, acertamos preços e detalhes. Duas semanas depois tinha um fogão e geladeira novinha em folha.
O rapaz chegou desconfiado, estava com o filho e se espantou com minha alegria excessiva ao ver o trabalho terminado.
_ Linda! Meu Deus ficou lindíssima! Não me contive e os mesmos elogios pronunciei ao ver o fogão saindo do elevador.
_ Ó dona, vou te falar... fiquei com medo da senhora não gostar!
_ Uai? Por que se fui eu quem contratou seus serviços?
_ É que as pessoas passavam, vinham lá do ponto do ônibus e até dos bombeiros, olhavam esquisito, diziam que a cor era feia, que aquilo era coisa de maluco que fugiu de hospício!
_ Ah! Deixa para lá moço! É que acordei assim, verde, verde bandeira do Brasil!
Ele suspirou aliviado e me prometeu pés novos e verdes para o fogão, enquanto eu abraçava e beijava meu fogão e geladeira totalmente verde de alegria.
Eu tenho uma geladeira verde! Inacreditável o sentimento de liberdade, de quebra de algemas. Abracei a danada, dei-lhe beijos estalados e sorria...verde! Que ousadia a minha _ pensei _ será que vou pro inferno por quebrar a corrente do branco?
Nada! Lembrei. O capeta é vermelho, o caldeirão é preto e o inferno não é lugar de branco! Ao diabo quem sumiu com as cores!



Um comentário:

  1. Achei muito interessante esse texto pois mostra que a sociedade não é necessariamente obrigada a seguir um padrão seja ele de cores,etc.

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