PALAVRÃO
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Marina da
Silva
Nasci na
ditadura militar que ditava todas as regras no país e também dentro e fora dos
lares. Entre as inúmeras proibições na família, uma era o nome feio, o
palavrão, especialmente para nós mulheres. Dois de meus irmãos eram bocas sujas
e o mais atentado, o comunista, tinha a mania de xingar a gente de rapariga e
"felha" da puta!
Cresci
travada, dando topadas com o dedão, xingando baixo, merda, bosta ou desgraça
pelada para garantir na boca boa parte da dentição.
_ Mão na
boca antes que o pé a alcance! Boca fechada conserva os dentes! Quem fala
demais dá bom dia a cavalo!
A ditadura
acabou e um arsenal de palavrões invadiu as ruas, praças, rádios, jornais,
revistas, programas de televisão, música, novelas. E eu ainda travada!
_ Mãe,
bate na boca dele, ele xingou palavrão! Um mico na pelada e eu não soube onde
enfiar a cara.
Quase
quarenta anos e não passo do merda, bosta e abandonei para sempre a desgraça
pelada, o nome mais horrível que pronunciava e mamãe nunca o perdoava. Era
sempre porrada!
Educo
minha filha ensinando-lhe o significado de cada palavrão aprendido fora ou
dentro da família e ainda reprimindo sua expressão.
_ Há
lugares certos para se dizer um palavrão! Informo em todas as chamadas!
Aos
quarenta passei por uma revolução!
_ Minha
irmã está correta! Preciso relaxar mais, soltar a franga. Afinal quarentei e
não preciso mais de autorização para xingar, soltar arroto ou bufa!
Levo a
menina a um jogo de futebol e preparo para me esbaldar! O jogo é de vida; ou
morte na segunda divisão. Assisto o primeiro tempo tão aflita que esqueço minha
predisposição de xingar.
No
intervalo mudo de lugar, sento em meio à rapaziada, preciso me libertar!
A poucos
centímetros de mim, um degrau abaixo na arquibancada, senta-se uma senhora com
uma menina. Como eu, cerveja na mão, mas na outra ostenta ainda um cigarro.
O jogo
recomeça e era uma mulher destravada:
_Porra!!!
Caralho Fábio Júnior!
Minha
filha me cutuca, os homens silenciam-se, parecem chocados?!
_ Vai
tomar no seu cu Cicinho! Viado, seu córno!
Meu rosto
arde em brasa. E é tanto filho da puta,
cusão, boiola, puta que pariu, buceta arregaçada, que cai por terra toda a
minha disposição de dar uma destravada.
Meu time
ganhou no último minuto, com um pênalti roubado; um bêbado caiu por cima de
mim, desequilibrado, e eu:
_ Bosta,
merda _ só mentalmente_ sem o desgraça
pelada!
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