O EDREDOM
Marina
da Silva
Thaís abriu e
fechou a porta do apartamento maquinalmente jogando descuidada as chaves sobre
o aparador. Se lhe perguntassem não conseguiria explicar como dirigiu seu carro
até sua casa. No corredor deu de frente com a mãe que chegara do trabalho e
saía enrolada numa toalha de banho.
__Oi filha!
Aconteceu algo?
A menina muito
pálida nada respondeu entrando no quarto e batendo desleixada a porta.
__Essa não é
minha filha! Pensava a mãe aflita enquanto se vestia. Nunca vira a menina
daquele jeito: os olhos perdidos, amarela e andando tal qual um zumbi. Bateu na
porta e como não obteve resposta entrou.
Sobre a cama, o
edredon que Janaína, sua prima e melhor amiga lhe dera para compor o enxoval.
Era uma peça cara e fina, em tom pastel, com barrados de tira bordada no mesmo
tom. Sentada, as costas apoiada no guarda-roupa a menina soluçava
incontrolavelmente.
A mãe nada
disse, mas pressentiu que algo terrível acontecera entre os noivos e logo a uma
semana do casamento.
__Mãe, porque
dói tanto? Apertava a garganta. Está
doendo muito mãe! Grossas lágrimas pingavam no frio granito.
__Eu quero
morrer! Eu quero morrer!
Sem nada dizer a
mãe sentou-se ao seu lado, tomou-a nos braços afagando seus loiros cabelos.
__Vai passar meu
anjo! Vai passar! Repetia automaticamente querendo pegar naquele abraço toda a
dor da filha para si, protegendo-a a qualquer custo.
__Eles estavam
juntos... As palavras passavam rasgando a garganta dolorida. Ninguém me contou
mãe...
A mulher
estremeceu ao entender o que tinha ocorrido.
__Eles estavam
juntos e se atracando no almoxarifado da firma... Eu vi mãe! A voz quase
inaudível vinha aos solavancos entrecortadas pelos soluços.
__Psist! O som
saiu sibilando baixinho entre os lábios da mãe. Não vamos falar mais nisso! Foi
melhor agora do que depois do casamento. Venha pro meu quarto, vou lhe dar algo
para parar a dor. E aqui colocou a mão
sobre o peito da garota.
A menina se
deixou levar como um molambo ou boneca de pano; tomou obediente o comprimido
dado pela mãe e gostou desse aconchego ali.
__Fica aqui
comigo mãe! A mãe de lá não desgrudou.
Quando a menina
acordou já era noite e chovia muito. Do quarto ouviu a mãe mexendo na cozinha.
Então saiu de fininho, arrastando atrás de si o edredon, tal qual, quando ainda
criança, arrastava pela casa seu amado cobertor. Thaís abriu a portaria do
prédio foi para o asfalto e abriu ali o edredon como se cobrisse um leito
nupcial. Ajeitou com cuidado as fronhas e subiu novamente para o apartamento.
Da janela da
cozinha a mãe assistia a tudo sentindo-se sangrar por dentro ao ver tamanha
dor.
__Mãe você pode
me dar um comprimido para eu não acordar nunca?
A mulher
abraçou-a, acariciou-a por longos minutos e estão o choro a ambas voltou.
Lá embaixo, indo
ao supermercado do bairro depois de sair do serviço, uma mulher e sua filha
estranham ver um enorme pano branco esticado no asfalto e passam rente ao meio
fio sem darem conta do que seja aquilo e quem ali o colocou.
Na volta, a
motorista não resiste, pára o carro, desce e estupefata percebe que o asfalto
fora coberto com um edredon. Já passam das dez da noite; ela olha intrigada as
janelas dos prédios e sem saber mesmo porque, recolheu triste a peça totalmente
encharcada pela chuva.
__O que será que
aconteceu? O que fez alguém estender aqui um edredon? Pensava intrigada.
No dia seguinte
avaliando os estragos feitos pelos pneus na peça quando ela a atravessou, uma
pergunta exigia, mas não havia resposta: qual seria a triste história daquele
edredom.
Legal, Marina! Você escreve de maneira inteligente, criando uma expectativa no leitor, sem resolvê-la. Gostei muito. Escreva mais, cara amiga. Afinal, você já públicou; publique de novo! Beijo, Angela
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