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terça-feira, 17 de outubro de 2023

: dar pena na tv

 14-04-2005

URGENTE BRASIL DÁ PENA NA TV

 

2005. Vinte e nove de novembro. Perto das dez e meia da noite.

Pânico e horror! Um ônibus, linha 350 – Passeio/Irajá no Rio de Janeiro é interceptado por cerca de sete pessoas que ensandecidas jogam gasolina e uma bomba caseira que explode em meio a cerca de trinta passageiros, deixando doze feridos e cinco mortos, dentre eles mãe e filha de um ano e meio, mortas carbonizadas.

Não era um ataque terrorista do Hamas, da Al-Quaeda, do Hezbolah, do ETA ou IRA, do Fatah. Não era o terror norte-americano sobre o Afeganistão e Iraque; não eram ataques de judeus e palestinos e muito menos uma guerra pelo controle do tráfico de drogas nas inúmeras comunidades pobres do Rio.

2005. Trinta de Novembro.

O dia inteiro e a toda hora no rádio, nos jornais e canais de TV, a notícia é veiculada causando consternação geral. Ainda se sabe pouco sobre o atentado. Quem? Por quê? A mando de quem?

Aos poucos uma história vai se construindo, uma versão dos fatos vai tomando forma nos jornais e telejornais através das investigações policiais e de jornalistas e dos depoimentos dos sobreviventes, das testemunhas do ataque. O ônibus teria sido carbonizado a mando de traficantes de uma favela em represália a morte de um de seus traficantes, de vinte e dois anos, pelos rivais do tráfico vizinho.

Enquanto a mídia séria, o jornalismo autêntico sai a campo para colher as informações, as possíveis hipóteses sobre o ataque, um programa sensacionalista de TV, totalmente descompromissado com tudo, autorgando a si o direito divino de ditar a justiça, inicia o julgamento, conduzindo  um linchamento televisivo ao vivo e a cores com frases abusadas e posicionamentos absurdos, via de regra repetidos em cada programa.

O untoso jornalista, apresenta o caso fatiado, faz chamadas ao vivo, chega ao desplante de encurralar policiais e delegado para subtrair informações e induzir hipóteses na investigação.

_ “Cinco pessoas morreram carbonizadas _ brada baboso e irado _ treze estão feridas”!

 De olhos esbugalhados saltitando pelas órbitas o homem anda nervosamente pelo cenário enlouquecido, levando atrás de si, Jesus, o pobre câmeraman que é desancado sem piedade e exigindo justiça imediata, para ontem. “Os bandidos não podem impunes”. Saliva raivoso.

O arsenal de xingamentos diários é reforçado: canalhas, vagabundos, safados, marginal, bandidos, salafrários.

“Eu não só sou a favor da pena de morte como quero estar lá e apertar o botão da cadeira elétrica”, lembro-me bem dessa frase repetida em vários programas.

A todo  momento o homúnculo cobra a justiça de justiceiros atropelando todo o sistema judiciário brasileiro.

_“Havia uma criança _ parece estar avisando a alguém do outro lado da telinha _ nenhum bandido toleraria um crime tão hediondo!

Bandido?! O recado é para algum bandido?!

 – “Queimar viva uma criança”! Repete a todo instante.

E anda de um lado para outro, move os olhos sádicos, pervertidos, clama justiça imediata dirigindo-se a alguém. Mas quem?

2005. Primeiro dezembro.

Uma tragédia anunciada, pedida, ordenada para aplacar uma terrível tragédia! A pena ditada pela TV foi cumprida! Quatro homens, quatro supostos traficantes envolvidos no ataque ao ônibus da linha 350 – Passeio/Irajá foram executados à bala.

No local do crime há um recado rabiscado num velho papelão.

_ Para quem? Constato tristemente.

“Nós do CVRL não aceitamos ato de terrorismo.

 CV - lado certo da vida errada. Fé em Deus”!

Que Pena! Dá enorme pena...e foi tudo pela TV.

 

 

 

 

 


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