FUMAR ERA TUDO DE BOM
Sérgio Antunes de Freitas
Em várias décadas do século passado, fumar era chique. Estava na moda!
Lembro-me do comentário de uma jovem conhecida: - Ah! Dançar com um garoto, com cheiro de perfume misturado com cheiro de cigarro, é bom demais!
Muita gente defendia o tabagismo. Tudo por consequência de fortes campanhas publicitárias das indústrias do tabaco, nacionais e estrangeiras.
Nos filmes de Hollywood (“o sucesso”), os galãs sempre apareciam com seu inseparável companheiro entre os dedos.
As estrelas também esbanjavam charme, com suas piteiras e estojos para os maços e para os isqueiros, decorados com requinte. E expeliam a fumaça como se estivessem pedindo um beijo.
Nos filmes de faroeste, o mocinho fazia pose em cima do cavalo e acendia o pito com as mãos em concha, sem tirar o olhar fatal do bandido.
De repente, sacavam suas armas e, nesse momento, o cigarro sumia de cena como por encanto.
Por certo, o continuísta acusava a falha, mas o diretor dizia: - Shut up, stupid! No suspense, ninguém notaria o aparente erro.
Já conhecedor dos incêndios florestais, desde quando assisti ao filme “Bambi” do Walt Disney, eu ficava preocupado com a possibilidade de a bituca cair em uma touceira de capim seco. E torcia para o cavalo apagar, pisando em cima. Afinal, cavalos de filmes de faroeste são ensinados!
Aos poucos, a sociedade brasileira, ouvindo a ciência verdadeira e acompanhando países mais desenvolvidos, foi sabendo dos males causados pelo vício e outros desconfortos paralelos.
Mas, havia os reticentes: - Meu avô está com oitenta anos, fuma desde os dezesseis e é uma fortaleza.
Até médicos pneumologistas fumavam e diziam não ser tão alarmante o perigo das doenças. Com o tempo, abandonaram o cilindro nicotinoso, claro!
Perguntada se sabia que o cigarro poderia matá-la, uma jovem e linda professora respondeu com ironia e graça: - Você conhece uma forma mais deliciosa de suicidar-se?
No fundo, o vício era apenas uma muleta emocional!
Muitas pessoas deixaram de visitar amigos, devido ao odor dos cinzeiros em suas casas. Mas quem fumava ficava acostumado com a catinga e não se incomodava.
E o embate entre fumantes e não fumantes foi tomando corpo.
Nos aviões, havia uma fileira para fumantes, mas o cheiro e a fumaça não obedeciam às regras. Mais tarde foi proibido em todos os voos e viagens de ônibus.
A mesma coisa aconteceu em bares, restaurantes e outros locais.
Ainda assim, os governos não conseguiam vencer a luta contra os fortes interesses econômicos das indústrias. Nem mesmo aumentando os impostos sobre o produto, que eram repassados aos consumidores. Os viciados deixavam até de comer melhor, porém continuavam tragando as fumaceiras.
E as propagandas antitabagistas na televisão e nos próprios maços de cigarros pouco efeito faziam.
Mas veio um golpe certeiro, reduzindo drasticamente a quantidade de fumantes, qual seja, a proibição da aparição de cigarros em propagandas e programas de televisão, mediante leis de 1996 e 2011.
Quem foi testemunha ocular de toda essa história sabe como a propaganda exerce domínio nas mentes das pessoas e, especialmente, dos jovens. Por isso, ela precisa ter o controle da sociedade, com vistas ao bem público.
Em 2003, a Lei do Desarmamento proibiu a propaganda de armas. Agora, na contramão da civilização, um deputado propôs a liberação desse tipo de divulgação nos veículos de comunicação e redes sociais.
Passou pela minha cabeça que, inescrupulosamente, em todos os sentidos, esse parlamentar é financiado pelas indústrias de armamentos.
Nossa! Como eu sou maledicente, né?
Sérgio Antunes de Freitas
Junho de 2022
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