Postagens populares

Pesquisar este blog

quinta-feira, 2 de abril de 2020

BRAZIL: COVID-19. PERMANEÇA EM CASA...LENDO.


MERDA POUCA É BOBAGEM!
Marina da Silva

Esse era o pensamento que atolava minha cabeça enquanto grossas lágrimas desciam-me dos olhos, quando um enorme estrondo de trovão me fez estacar já à saída do PROCON, ali perto do hospital João XXIII.
Acompanhando o barulho ensurdecedor, raios, relâmpagos, ventania, grossas gotas de chuva davam início a uma tempestade de verão. Em milésimos de segundos um aguaceiro desceu do céu num espetáculo, aos meus olhos, belíssimo.
Cinco minutos antes, estava eu estupefata e estática diante da impossibilidade de fazer uma reclamação junto ao PROCON porque, na impaciência em acabar com a amolação e morto de cansaço, meu marido me impediu de acionar a polícia para lavrar uma ocorrência contra uma loja de eletrodomésticos num shopping.
Trinta minutos antes do início da chuva eu descia do buzão próximo ao pronto socorro João XXIII e do PROCON e abençoava o dia por ter que andar menos que uma quadra. Atravessei a rua facilmente e de repente, nem sei como, assim do nada deslizei pelo passeio frente ao colégio Pedro II, decolei do chão indo cair estatelada bem em cima de um bueiro estourado.
Caíra literalmente na merda! Tinha meleca nas mãos, braços, rosto, nos pés e em toda a minha calça, que por azar era de um branco total radiante.
Socorreram-me solícitos alguns rapazes. Pedi-lhes um segundo para ver se não havia nada quebrado, pois, um mais desavisado já ia me erguendo por debaixo dos sovacos. Após averiguações dispensei três deles e pedi ao mais tranqüilo para me ajudar a levantar. Era um desses garotos que tomam conta de carros e muito educadamente me conduziu ao pronto socorro do outro lado da rua. Tive vergonha de pedir assistência no João ao ver a ambulância despejando um indivíduo que acabara de ser atropelado. Afinal eu só caíra no esgoto e tirando a bosta estaria novinha em folha. Um banheiro e sabão resolveriam o meu problema!
Razoavelmente limpa, entrei na primeira lojinha que encontrei, comprei um jeans, escondi o sujo da blusa debaixo da calça e me dirigi ao PROCON.
Dois dias antes, menos de quarenta e oito horas começava o meu dia de cão, ou melhor, de merda!
No sábado, após pensar e repensar e avaliar e contabilizar gastos resolvi a pendenga em que entrei ao descobrir a máquina de lavar roupas quebrada pela enésima vez. Também pudera, a bicha já tinha quase uns quinze anos e resolvi não protelar mais a compra de uma máquina novinha em folha.
Chegamos ao shopping por volta das dezenove horas; jantamos num desses restaurantes SOS – sobras de ontem sortidas e iniciamos a pesquisa de preço no primeiro piso, onde se localizavam as três maiores lojas de eletrodomésticos da cidade: PF, B, R.
Nas três lojas, a máquina escolhida estava em promoção cartelizada: R$999,00. Começamos a negociação para tentar conseguir um desconto no preço à vista.
“A senhora vê quanto lhe dá as outras lojas e nós cobrimos o preço”. Garantiu-me simpaticamente o vendedor do PF.
Nas casas B chateado por ser o primeiro a dar o lance, o vendedor abaixou em cinqüenta reais o preço do produto. Então fomos atrás do R e o vendedor muito educado, apesar de não abaixar o preço, prometeu cobrir a oferta do PF. Era um ótimo jogo! Voltamos lá e o rapaz entrou de peito na briga e a máquina agora saía por R$900,00.
“Quero ver eles cobrir!!” Sorria.
Meu marido cansado de andar de lá pra cá insistia em fechar o negócio ali mesmo. Eu não lhe dei ouvidos e fui pagar para ver. Afinal não estava escrito em letras garrafais e até fechado compromisso em cartório que o R oferta?
Agora estava com o vendedor que assustado avisou que iria conversar com a gerente, uma mulherzinha magricela e desmilinguida que conversava nervosamente e ao mesmo tempo, ao telefone e com um cliente.
A fulana não quis conversa e nem sequer se deu ao trabalho de nos receber. Mandou um recado grosseiro, dizendo que o PF estava blefando, que eles não tinham a mercadoria para entrega imediata e só acreditaria em nós se tivéssemos um papel escrito pela loja.
Meu marido, não sei se pelo cansaço, estava prestes a deixar o local, mas eu me enfureci e entrei na loja para conversar com a dona e então ela me desacatou, humilhou, fez-me grosserias agindo como uma louca.
“Olha moça - tentei argumentar - eu só quero que vocês cumpram o que está escrito na porta da loja!”
A mulher me deu as costas e fingia falar ao telefone:
“Péra aí!” Encostei-lhe no braço e ela gritou como se tivesse recebido uma bifa do Tyson:
“Tiiiiira essa mão de mim!!!”
Alguém me puxou pelo braço, era o marido, enquanto o vendedor me pedia desculpas consternado e tudo sob os olhares de clientes e funcionários. A loja inteira parou ao ouvir os berros da mulher e eu a chorar.
“Eu só queria que ela honrasse a palavra, o compromisso do R! Ela é só uma reles funcionária! A gente tem que ter honra e brio na cara!” Desabafava entre soluços e lágrimas.
Nos vinte minutos seguintes o negócio estava fechado com o PF e meu marido louco para escapulir dali não quis fazer a ocorrência policial e na segunda-feira seguinte, após levar o maior tombaço numa rede de esgoto estourada e ficar totalmente cagada de cima a baixo, ouvi entristecida e desolada que nada poderia ser feito porque não fizemos a tal da ocorrência.
Fiquei indignada por não poder usar o caminho legal e dar naquela megera, bruaca, uma boa ferrada dentro da lei.
Levantei os olhos cheios de lágrimas lembrando Veríssimo, o escritor, que narra de forma hilária o dia em que literalmente esteve na merda.
“Agora só podem me acontecer coisas boas!” Pensava. E foi então que levei o maior susto com o trovão e fiquei mais de vinte minutos, ali, sentada dentro do PROCON, admirando extasiada a tempestade e limpando minha alma!






Nenhum comentário:

Postar um comentário